Há um mistério difícil de resolver em torno de José Cardoso Pires (nascido a 2 de outubro de 1925, em Vila de Rei, morreu a 26 de outubro de 1998, em Lisboa). Se, mesmo sem serem lidos, Alves Redol ou Soeiro Pereira Gomes conservam uma certa universalidade marxista, em que qualquer leitor, de qualquer país, reconhece aquele teatrinho de pobres contra ricos, se Jorge de Sena faz jus à sua condição de expatriado e não há nada, nem na sua Figueira da Foz, nem sequer na Guerra de Espanha, que seja menos do que existencial, Cardoso Pires parece apenas uma figura local, um escritor de província em que a sua província é a capital, interessante como um fóssil etnográfico que conserva as manias e o modo de pensar de uma certa Lisboa pequeno-burguesa, a tentar encontrar uma voz política e libertar-se da sua condição. Há nele um esforço de conservar a história dos locais por onde passou e que formam as raízes do seu mundo, seja a Quinta das Virtudes, seja o espaço de Amadeo Souza-Cardoso; no mundo de latifúndios e luta de classes de Alves Redol entra a história dos Relvas, da Casa dos Patudos e das origens da República, de um modo que o liga ao centro da história do Ribatejo; com Cardoso Pires, porém, não é isso que se passa.
Author: Carlos Maria Bobone
Published at: 2025-10-01 17:11:42
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