Carros que mudaram o mundo #21: Mini

Carros que mudaram o mundo #21: Mini


quando a gasolina começou a ser racionada no reino unido em 1956 os britanicos tiveram um deja vu amargo mal fazia dez anos que a guerra havia terminado e a ideia de limitar o uso do carro por falta de combustivel remetia aos tempos dificeis e dolorosos do conflito mas eles nao tinham escolha a crise do canal de suez ameaçava o acesso ao petroleo do oriente medio e a economia europeia precisava se adaptar o quanto antes para a industria o impacto foi imediato carros medios e grandes encalhavam nos patios das concessionarias enquanto os consumidores migravam para os chamados microcarros — veiculos minusculos com motores de moto e espaço apenas para dois ou tres ocupantes de repente projetos bizarros como o messerschmitt kabinenroller e o bmw isetta tomavam as ruas das cidades oferecendo o minimo possivel em troca de economia de combustivel a industria britanica que ate entao ignorava esses carrinhos excentricos logo percebeu que estava sendo deixada para tras por uma nova demanda que nao sabia atender foi nesse cenario que a british motor corporation bmc resolveu agir seu presidente leonard lord detestava os microcarros tanto quanto se preocupava com o avanço destes modelos para ele aquilo nao era automobilismo mas se o publico estava disposto a comprar carros pequenos e economicos entao a bmc precisava oferecer uma alternativa — e nao apenas uma alternativa ele queria algo superior um carro compacto que fosse ao mesmo tempo espaçoso moderno economico barato e seguro um projeto que mostrasse que os britanicos ainda sabiam fazer engenharia de verdade para isso lord foi buscar um nome conhecido alec issigonis nascido em 1906 em esmirna no imperio otomano de pai grego e mae alema foi criado em meio ao colapso do mundo antigo e aos deslocamentos forçados da guerra apos perder o pai ainda adolescente migrou com a mae para o reino unido e se naturalizou britanico — um estrangeiro com sotaque carregado e ideias pouco convencionais ele nao era engenheiro de formaçao classica reprovou em matematica tres vezes antes de conseguir se formar na battersea polytechnic mas tinha uma compreensao intuitiva de mecanica e uma obsessao pelo essencial espaço peso funçao era um homem de convicçoes fortes e aversao profunda a burocracia — o tipo de sujeito que apagava as luzes do escritorio de proposito quando queria trabalhar em silencio issigonis ganhou notoriedade na morris por projetar o morris minor lançado em 1948 era o primeiro carro britanico a adotar suspensao independente nas quatro rodas e estrutura monobloco — soluçoes avançadas para seu tempo mesmo que disfarçadas sob um desenho tradicional mas foi com o mini que ele se libertou dos compromissos esteticos e comerciais e deu vazao total a sua filosofia um carro pequeno pratico ousado projetado de dentro para fora mais artista do que engenheiro no sentido convencional alec issigonis acreditava que a forma devia seguir a funçao com radicalidade detestava enfeites e modismos costumava dizer que a engenharia e para pessoas que gostam de numeros eu gosto de resolver problemas e ao entregar o projeto nas maos do engenheiro grego britanico lord nao apenas deu inicio ao desenvolvimento de um novo carro — deu inicio a criaçao de um novo paradigma porque o que issigonis estava prestes a conceber nao era so uma resposta a uma crise mas tambem um simbolo de uma nova era o desenvolvimento do mini alec issigonis nao aceitava meios termos quando reassumiu seu posto na bmc para liderar o projeto do carro pequeno deixou claro desde o inicio faria do seu jeito sem interferencia leonard lord impaciente com a lentidao da industria britanica em reagir aos microcarros europeus estava disposto a aceitar essa condiçao ele nao queria apenas um carro menor queria uma demonstraçao de força — e issigonis estava pronto para entregar exatamente isso o projeto recebeu o nome burocratico de ado15 — amalgamated drawing office numero 15 — e nasceu com um proposito radical criar um carro que ocupasse o minimo possivel por fora mas entregasse o maximo possivel por dentro para issigonis a unica maneira de atingir essa meta era abandonar quase tudo o que os britanicos consideravam padrao em engenharia automotiva começou posicionando o motor a series de 848 cm³ na transversal uma heresia para os padroes da epoca depois empilhou o cambio diretamente sob o bloco dentro do mesmo carter de oleo formando um conjunto compacto que liberava espaço na cabine essa integraçao obrigou a usar o mesmo lubrificante para motor e cambio — soluçao engenhosa mas que cobraria seu preço anos depois a traçao dianteira permitia eliminar o tunel central abrindo espaço para um assoalho plano e bancos montados quase sobre as rodas mas ainda nao bastava para aproveitar cada centimetro issigonis reduziu ao minimo o espaço das caixas de roda o que exigia um novo tipo de suspensao foi entao que chamou seu velho conhecido alex moulton que projetou um sistema com cones de borracha em vez de molas metalicas era simples leve compacto e eficiente permitia um curso progressivo com pouco espaço e dava ao carro uma estabilidade surpreendente para o tamanho e para completar o conjunto issigonis mandou instalar rodas de apenas dez polegadas quase do tamanho de um prato de jantar parecia absurdo mas fazia sentido rodas menores tomavam menos espaço na carroceria e permitiam bitolas mais estreitas e curvas de carroceria mais fechadas o primeiro prototipo funcional surgiu em meados de 1957 era cru tosco feito quase artesanalmente foi apelidado de orange box devido a sua pintura laranja e seu formato retangular este prototipo circulava a noite por estradas secundarias para evitar fotografos e espioes industriais repare como a pintura e laranja o entre eixos curto o comportamento agil e o espaço interno desconcertante para quem visse por fora ja mostravam que aquilo nao era so mais um projeto de carro barato issigonis dirigia pessoalmente os prototipos acompanhado por tecnicos e engenheiros que mediam ruidos vibraçoes temperatura interna e consumo de combustivel cada detalhe era revisto obsessivamente o carro ainda vibrava demais o calor do cambio subia direto para o assoalho e o isolamento acustico era quase inexistente mas o conjunto funcionava era compacto esperto espaçoso e tinha uma direçao direta como nenhum outro carro da epoca no fundo issigonis subverteu tudo que a engenharia automotiva britanica tinha como padrao o mini nao era a adaptaçao de um carro grande para um formato menor e sim a reinvençao completa do conceito de carro urbano em vez de espremer pessoas em torno do motor issigonis apertou a mecanica em volta das pessoas a proporçao final era absurda para a epoca mais de 80% do volume do carro era reservado aos ocupantes e a bagagem so isso ja era uma afronta a logica de toda a industria quando a bmc finalmente deu sinal verde para a produçao nao havia certezas o carro era diferente demais estranho demais ousado demais ninguem sabia ao certo se o publico entenderia o que aquele projeto representava mas para issigonis a missao ja estava cumprida mais que um carro ele criou uma nova forma de se pensar em carro e em mobilidade um pequeno estranho quando finalmente chegou o dia de apresentar o mini ao publico em agosto de 1959 a bmc lançou dois modelos praticamente iguais porem com nomes diferentes o austin seven e o morris mini minor a ideia era que ambos atendesse publicos distintos apesar de dividirem quase tudo — plataforma motor suspensoes e ate dimensoes exatas mas para muitos o mini parecia mais um carro estranho do que uma revoluçao com seu formato quadrado rodas minusculas e proporçoes incomuns nao era exatamente um objeto de desejo imediato os primeiros compradores encararam o carro com uma mistura de curiosidade e desconfiança afinal estavamos falando de um veiculo muito menor e diferente do que o mercado estava acostumado a ideia de um motor colocado transversalmente com cambio integrado e traçao dianteira parecia quase futurista — ou para alguns apenas uma gambiarra arriscada as rodas pequenas que proporcionavam um espaço interno generoso deixavam a impressao de que o carro poderia ser instavel ou desconfortavel mesmo a imprensa automotiva que acompanhava de perto o lançamento ficou dividida alguns elogiaram o espaço interno surpreendente o consumo baixo e a agilidade nas ruas estreitas das cidades inglesas outros porem criticaram a suspensao pouco convencional o acabamento simples e o desempenho limitado para rodovias mais longas era um carro pensado para um contexto urbano e economico muito especifico e isso nem sempre era facil de comunicar para o publico geral durante os primeiros meses ajustes foram feitos a bmc aprimorou detalhes como o arrefecimento do motor o isolamento acustico e o acabamento interno o nome mini que inicialmente era apenas um apelido informal começou a ganhar força e identidade propria superando as marcas austin e morris para se tornar sinonimo daquele conceito de carro compacto e inteligente aos poucos o mini deixou de ser visto como um mero carro barato ou excentrico para virar uma especie de simbolo de modernidade nao demorou para que o publico começasse a reconhecer a engenhosidade do projeto sobretudo para quem enfrentava diariamente as ruas apertadas das cidades britanicas onde espaço era um luxo a imprensa recebe o mini assim apesar de um começo um tanto timido e repleto de ceticismo o mini começou a conquistar seu espaço nao so como meio de transporte mas como uma nova forma de pensar a mobilidade urbana sua estranheza inicial era afinal apenas a primeira camada de um impacto que logo se mostraria muito mais profundo e duradouro o mini e pop com o passar dos anos 1960 o mini foi deixando para tras a imagem de carro racional e economico assumindo com força crescente um novo papel o de icone cultural britanico ele nao apenas sobreviveu ao seu inicio atribulado como se reinventou sem mudar sua essencia seu design permanecia quase inalterado — carroceria monobloco com formas retas e simpaticas rodas de 10 polegadas deslocadas para os cantos e uma cabine surpreendentemente espaçosa — mas o que havia em torno dele se transformava com velocidade vertiginosa a modelo twiggy com seu mini londres naquele momento era o epicentro de uma revoluçao estetica comportamental e musical o mini caiu como uma luva nesse cenario pequeno ousado e urbano ele se encaixava com perfeiçao no espirito do swinging london as ruas de chelsea soho e carnaby street passaram a ser povoadas por dezenas de exemplares coloridos e estilosos guiados por jovens que queriam distancia da sisudez da geraçao anterior de repente o mini estava nos mesmos lugares que os beatles aparecia ao lado de twiggy peter sellers mary quant e outros nomes que definiram o estilo de uma decada o mini virou acessorio de estilo como as roupas ou os cortes de cabelo da epoca paul mccartney e seu mini os quatro beatles tiveram o modelo essa transformaçao nao foi resultado de uma campanha publicitaria planejada ela veio da forma como o carro era percebido compacto e acessivel mas ao mesmo tempo cheio de personalidade era possivel escolher entre dezenas de cores revestimentos internos e ate versoes mais esportivas ou luxuosas como os modelos riley elf e wolseley hornet com traseira estendida e acabamento refinado as versoes mini cooper e cooper s com desempenho surpreendente reforçavam ainda mais o prestigio do modelo entre os mais jovens e endinheirados foi tambem nesse contexto que surgiram preparaçoes esteticas e mecanicas sob medida feitas por pequenas oficinas especializadas e pela propria john cooper garages o resultado foi um fenomeno de popularidade sem precedentes para um carro daquela categoria a produçao passou da marca de 200 mil unidades anuais ja em 1962 e atingiu o pico em 1971 com mais de 318 mil carros fabricados so naquele ano e mesmo com a crescente concorrencia no segmento de compactos — que começava a florescer no japao na italia e ate mesmo dentro do reino unido — o mini se mantinha atual nao por evoluir mas por permanecer fiel a uma proposta que agora era vista como tendencia nao exceçao culturalmente o mini simbolizava um novo jeito de viver era o carro de quem morava sozinho em apartamentos pequenos de quem dispensava o conservadorismo e valorizava a liberdade era ideal para os becos estreitos de notting hill ou para fugir da cidade rumo ao interior nos fins de semana seu custo baixo aliado ao visual descolado e a capacidade de carregar quatro adultos com bagagens minimas o tornava nao apenas desejavel mas sensato bastava estaciona lo para deixar claro quem voce era esse papel simbolico ajudou a perpetuar o mini como objeto de desejo mesmo entre aqueles que jamais se interessaram por carros a industria do cinema e da televisao o adotou com entusiasmo filmes como um golpe a italiana the italian job 1969 eternizaram a imagem do mini voando por escadas tuneis e ruas estreitas de turim provando que nao era apenas charmoso mas tambem ousado e capaz o carro que nasceu de uma crise de combustivel e de uma planilha de corte de custos agora era um icone pop um simbolo de uma inglaterra jovem provocadora e em movimento um esportivo em miniatura — ou o nascimento do pocket rocket a ideia de transformar o mini em um carro de corrida nao partiu de alec issigonis ele era cetico quanto ao apelo esportivo do seu projeto para ele o mini era uma resposta funcional a um problema social — transporte eficiente em espaço urbano — e nao via sentido em corromper esse proposito com motores mais fortes ou ambiçoes competitivas foi john cooper entao um dos nomes mais respeitados da formula 1 quem enxergou o potencial de performance que issigonis preferia ignorar cooper conhecia o projeto do mini a fundo como fornecedor de componentes e velho conhecido da industria teve acesso antecipado ao ado15 e imediatamente percebeu o que ninguem ainda via o carro era leve tinha um entre eixos curtissimo centro de gravidade baixo e um comportamento naturalmente neutro graças a traçao dianteira — uma combinaçao explosiva para rali com a suspensao de cones de borracha desenhada por alex moulton o mini era capaz de manter os quatro pneus no chao mesmo nas piores condiçoes transmitindo ao piloto uma precisao rara em carros populares da epoca cooper insistiu com a bmc para fazer uma versao esportiva issigonis torceu o nariz mas leonard lord — que via ali uma chance de marketing com baixo investimento — autorizou a empreitada o primeiro mini cooper nasceu em 1961 a receita foi simples mas cirurgica o motor a series de 848 cm³ no modelo original foi substituido por uma versao de 997 cm³ com virabrequim de curso mais longo e comando mais agressivo o cabeçote foi retrabalhado com valvulas maiores e o sistema de alimentaçao ganhou carburadores su duplos algo incomum em carros desse porte isso elevou a potencia para 55 cv — o suficiente para transformar um carro de menos de 600 kg em um canhao urbano a caixa de marchas tambem foi revisada com relaçoes mais curtas e os freios a tambor deram lugar a discos na dianteira algo inedito num carro tao acessivel na epoca mas a verdadeira virada veio com o mini cooper s lançado em 1963 a cilindrada subiu para 1071 cm³ depois 970 e 1275 cm³ dependendo da homologaçao desejada para competiçao essa ultima versao a de 1275 seria a mais famosa — nao apenas pela potencia superior agora na casa dos 75 cv mas porque foi ela que transformou o mini em um carro imbativel nos ralis da decada o cooper s tinha freios com servo assistencia taxa de compressao aumentada carburadores su hs2 ou hs4 dependendo do ano e um acerto de suspensao mais firme mantendo os cones de borracha mas com batentes mais rigidos a direçao direta e o peso reduzido permitiam um tipo de pilotagem quase instintiva — o carro respondia imediatamente aos comandos mesmo em pisos irregulares ou superficies de baixa aderencia o sucesso nas competiçoes nao demorou a equipe liderada por stuart turner e comandada por paddy hopkirk venceu o rally de monte carlo em 1964 com um cooper s de 1071 cm³ superando adversarios muito mais potentes como o mercedes 300se e o ford falcon a vitoria foi repetida em 1965 com timo makinen e novamente em 1967 com rauno aaltonen consolidando o mini como uma força improvavel mas real nos ralis internacionais a polemica desclassificaçao em 1966 — causada por um detalhe tecnico nos farois auxiliares que nao atendiam a interpretaçao francesa do regulamento — so aumentou a mistica mesmo sendo o carro mais rapido da prova o mini foi excluido e a decisao provocou um escandalo diplomatico no mundo do automobilismo essas conquistas colocaram o mini num novo patamar nao era mais apenas um carro acessivel e moderno agora era tambem um vencedor coberto de lama ate os farois atravessando a linha de chegada entre gigantes o mini virou sinonimo de valentia mecanica o publico respondeu com entusiasmo as versoes cooper e cooper s se tornaram objetos de desejo especialmente entre jovens entusiastas revistas especializadas celebravam o equilibrio dinamico e o comportamento agil do carro descrevendo o como uma especie de kart com portas — ou um foguete de bolso esse momento marcou uma virada definitiva na carreira do mini nao apenas porque conquistou titulos e manchetes mas porque provou que um carro bem pensado compacto e barato podia humilhar gigantes nas pistas e nas estradas em um mundo dominado por cilindrada e potencia bruta o mini mostrou que engenharia leveza e inteligencia podiam fazer mais diferença do que numeros no papel a partir dali o mini deixava de ser apenas uma soluçao urbana brilhante tornava se tambem uma lenda da performance a decadencia se os anos 1960 foram uma escalada meteorica para o mini os anos 1970 marcaram o inicio de uma descida turbulenta — nao em vendas imediatas mas na estrutura que o sustentava a crise nao começou no carro mas nas entranhas da industria automobilistica britanica a british motor corporation que ja havia engolido varias marcas para formar um imperio inchado e contraditorio virou em 1968 a british leyland motor corporation — uma fusao forçada promovida pelo governo como tentativa de salvar o que restava da industria automotiva local diante da ascensao dos fabricantes alemaes e japoneses o problema era que o mini embora fosse um sucesso de critica cultura e ate vendas nunca foi exatamente lucrativo sir alec issigonis o projetou com genialidade mas a obsessao por eficiencia de espaço simplicidade mecanica e custo acessivel levou a uma margem de lucro praticamente nula em alguns anos o mini dava prejuizo nao havia espaço para evolui lo sem mexer na estrutura e essa estrutura nao admitia mudanças sem comprometer sua identidade isso tornou o carro ironicamente vitima de seu proprio sucesso a british leyland herdou esse dilema sem saber o que fazer com ele a prioridade passou a ser o desenvolvimento de modelos novos teoricamente mais modernos e rentaveis como o austin allegro mas nenhum deles repetiria o impacto ou a aceitaçao do mini enquanto isso os concorrentes se mexiam o fiat 127 lançado em 1971 trazia carroceria hatchback de duas portas com motor transversal e traçao dianteira — exatamente o mesmo layout basico do mini mas com mais espaço conforto e uma construçao mais moderna em 1974 o volkswagen golf chegaria para redefinir o segmento dos compactos com a mesma formula mas elevada a um novo patamar de qualidade potencia e versatilidade do ponto de vista tecnico o mini começava a acusar a idade a estrutura monobloco ainda era solida mas o projeto original de suspensao hydrolastic adotado em 1964 e abandonado em 1971 revelava se fragil no longo prazo a geometria das rodas com angulos fixos e o uso de articulaçoes simples como as juntas homocineticas tipo pot joint ofereciam bom comportamento dinamico em piso liso mas nao combinavam com as estradas cada vez mais movimentadas e velozes da nova decada o sistema de freios seguia simples — a maioria dos modelos tinha freios a tambor nas quatro rodas — e o motor a series embora robusto nao evoluia o suficiente para acompanhar a concorrencia em eficiencia consumo ou emissoes as instalaçoes fabris tambem se tornaram um problema cronico a british leyland acumulava fabricas obsoletas greves constantes e uma burocracia interna quase sovietica o mini era fabricado em varias unidades diferentes — cowley longbridge ate mesmo na escocia — e cada planta tinha seus proprios metodos e padroes o que tornava o controle de qualidade um pesadelo isso se refletia no carro problemas de montagem pintura inconsistente infiltraçoes e falhas eletricas tornaram se comuns ainda assim ele continuava a vender era como se o publico estivesse disposto a perdoar suas falhas em troca de seu charme tamanho e preço os clubman originais havia tentativas pontuais de revitalizaçao surgiram variaçoes como o clubman com frente alongada e estilo mais quadrado mas que desagradava puristas e nao atraia novos compradores o modelo original continuava a ser o preferido a bl tentava capitalizar o sucesso com versoes especiais como o mini 1100 special e ate ediçoes comemorativas mas o nucleo do carro seguia o mesmo um projeto de 1959 que nao havia recebido nenhuma renovaçao estrutural profunda por mais de uma decada e meia hewlett packard o contraste entre o impacto cultural do mini e sua situaçao industrial revelava uma contradiçao fundamental ele era um icone em um imperio em ruinas a british leyland apesar do apoio governamental e de uma gama de marcas historicas caminhava rumo a insolvencia e o mini mesmo ainda popular estava cada vez mais deslocado em um mercado que exigia modernidade conforto segurança e desempenho sua magia resistia mas seus alicerces tremiam um anacronismo adorado quando a decada de 1980 começou o mini ja era paradoxalmente um veterano em um mundo onde ele mesmo havia ditado as regras do jogo so que agora ele jogava com cartas defasadas havia perdido relevancia como produto de massa mas ganhava contornos de culto em vez de evoluir o mini envelheceu em camera lenta — e o reino unido mergulhado em recessoes industriais e transformaçoes politicas sob margaret thatcher parecia arrasta lo consigo mas sua presença persistia e mais ainda havia demanda em parte isso acontecia porque a despeito da idade o mini continuava a oferecer uma experiencia de direçao absolutamente unica seu centro de gravidade baixo a distancia entre eixos curtissima e a combinaçao do motor a series com cambio manual de engates curtos — acoplado diretamente ao carter — davam ao carro um comportamento quase kartistico em transito urbano era imbativel no interior sua espartanidade parecia antiquada mas o publico juvenil e alternativo começava a enxergar nela uma especie de charme retro tornou se entao o carro dos descolados dos estudantes dos que queriam fugir da caretice dos hatchbacks genericos e japoneses na pratica porem era um milagre que ele ainda estivesse em linha a british leyland passou boa parte da decada em crise nacionalizada reorganizada privatizada no processo tornou se austin rover depois rover group varias marcas e projetos foram sacrificados o mini foi salvo ironicamente pela propria incapacidade da bl de substitui lo nenhum projeto paralelo — metro allegro maestro — conseguiu reunir o mesmo equilibrio entre preço apelo e identidade o metro lançado em 1980 era sua substituiçao oficial mas logo ficou claro que o publico ainda queria o original a soluçao foi mante lo em produçao mesmo que isso significasse operar fabricas com linhas antiquadas peças fora de padrao e tecnicas obsoletas nao havia plataforma moderna nao havia recursos digitais — tudo era analogico artesanal o motor a series ainda com carburador su agora era adaptado as novas normas de emissoes com gambiarras tecnicas avanço de igniçao mais conservador coletores reprojetados conversores cataliticos improvisados o resultado era um carro menos potente mas ainda muito leve 650 kg mesmo com os para choques mais pesados e itens obrigatorios de segurança no plano estetico houve leves revisoes o mini city o mini mayfair o mini advantage o red hot o check mate — versoes com mudanças cosmeticas decalques rodas diferentes internamente os instrumentos foram redesenhados o painel passou por atualizaçoes pontuais mas nunca houve um redesenho estrutural completo a base era a mesma a essa altura a produçao ja havia ultrapassado 4 milhoes de unidades mesmo dando pouco ou nenhum lucro o mini resistia como uma lembrança de quando a industria britanica ousava pensar diferente foi nesse contexto que a rover começou a atrair atençao estrangeira a honda se tornou parceira tecnica e acionaria nos anos 1980 colaborando em projetos e compartilhando plataformas mas quem de fato decidiria o destino do mini seria a bmw em 1994 o grupo bavaro comprou o rover group — mais pelos motores pelos projetos em andamento e pelas fabricas do que pelos modelos em linha ainda assim ao olhar para o mini os executivos alemaes viram algo raro uma marca com peso emocional valor historico e — acima de tudo — apelo global mas antes do renascimento era preciso encerrar o ciclo e o mini classico resistia em 1996 ele passou por sua ultima atualizaçao significativa recebeu injeçao eletronica monoponto airbags e sistemas minimos de segurança passiva a suspensao agora com cones de borracha aprimorados e amortecedores mais modernos tentava compensar as falhas de rigidez do monobloco o motor a series com seus quase 40 anos de idade era ainda o coraçao da maquina ja nao era o carro mais racional — e nunca foi mas era amado enquanto isso crescia um novo fenomeno o mini como objeto de colecionador revistas especializadas clubes encontros e preparadoras começaram a surgir em todos os cantos do reino unido modelos raros como o cooper s original passaram a valer pequenas fortunas ate versoes modestas com visual bem conservado começaram a atrair entusiastas e a cultura do restomod — de restaurar e modernizar minis classicos — começou a ganhar força um carro que nasceu como soluçao pratica para uma crise de combustivel havia se tornado icone cultural simbolo de resistencia estilo e personalidade em 4 de outubro de 2000 o ultimo mini classico saiu da linha de produçao de longbridge era um modelo cooper sport 500 com pintura metalica faixas brancas rodas minilite e placa comemorativa alec issigonis ja havia morrido ha 12 anos a fabrica foi tomada por operarios emocionados era o fim de um ciclo que durou 41 anos produziu 5 387 862 unidades e redefiniu o que significava fazer um carro pequeno mas o mini nao morria ali a bmw ja preparava sua ressurreiçao — e essa nova fase seria marcada nao mais pela austeridade mas pelo luxo pela tecnologia e pelo marketing global o icone se transformaria em marca mas essa e outra historia E mesmo com a crescente concorrência no segmento de compactos — que começava a florescer no Japão, na Itália e até mesmo dentro do Reino Unido — o Mini se mantinha atual não por evoluir, mas por permanecer fiel a uma proposta que agora era vista como tendência, não exceção. O carro que nasceu de uma crise de combustível e de uma planilha de corte de custos agora era um ícone pop, um símbolo de uma Inglaterra jovem, provocadora e em movimento.

Author: Leonardo Contesini


Published at: 2025-07-30 21:29:31

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