O que dá o tom é descrença de tudo, visto que um perdeu a mulher e o outro, a mãe, e agora lutam para se manterem unidos — e vivos —, não por alimentarem algum vestígio de fé, mas por pura pirraça. As diferenças quanto à constituição da narrativa no romance e no filme se agudizam um pouco — e quem leu o livro sabe exatamente do que se trata —, mas “A Estrada” conserva a essência do filme de ideia ao priorizar os embates filosóficos do protagonista consigo mesmo, ainda que a luta pela sobrevivência o impila a esquecer as elucubrações e tomar atitudes práticas a todo momento. A experiência diante do roteiro de Takahata, baseado no romance semiautobiográfico de Nosaka Akiyuki (1930-2015), de 1967, é uma imersão tão profunda nas contradições inevitáveis da condição humana que acaba-se questionando também a função desse gênero e do próprio cinema, um caminho a mais para se denunciar a estupidez, a intolerância, o ódio, e, no outro polo, a pulsão de vida confrontada com a morte que contamina tudo.
Author: Giancarlo Galdino
Published at: 2025-06-03 16:49:38
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